29 julho 2013

- Hiatos - Sete motivos para viver entre livros | Danilo Venticinque

  Boa noite leitores!
Estive pensando em postar essa matéria escrita pelo editor Danilo Venticinque já há algum tempo, hoje resoluta,  pedi sua permissão e estamos com vocês uma matéria muito bem elaborada sobre nossos preciosos livros.

Sete motivos para viver entre livros

As razões de um tradutor francês para acumular quarenta mil volumes em sua coleção, e o que podemos aprender com ele.

Poucas compulsões de consumo são tão bem vistas socialmente quanto o desejo de acumular livros. Ao contrário dos admiradores de sapatos, perucas, miniaturas ou outros bens de consumo supostamente fúteis, que são forçados a dedicar-se a suas paixões de forma quase clandestina para escapar do julgamento alheio, fãs de livros podem disfarçar seu descontrole consumista como uma implacável sede de conhecimento. O advento dos livros digitais tornou a vida do aspirante a bibliófilo ainda mais fácil. Se antes era necessário enfrentar as barreiras do espaço, hoje uma biblioteca de dezenas de milhares de exemplares cabe no bolso de qualquer paletó, ou mesmo num celular. Um cartão de memória do tamanho da unha de um dedão pode armazenar mais de trinta mil livros – um acervo equivalente feito de papel exigiria um apartamento inteiro para abrigá-lo. O custo também deixou de ser um empecilho. É possível encontrar uma infinidade de obras disponíveis gratuitamente na internet, em domínio público, e o preço dos exemplares novos, sobretudo os importados, é um convite à compra por impulso. 
A escolha entre os livros físicos e os digitais é uma questão de gosto, e um detalhe irrelevante diante da meta de formar a biblioteca ideal. Na busca por esse objetivo, tanto os fanáticos por tecnologia quanto os fetichistas do papel têm de se render aos ensinamentos dos grandes colecionadores do passado. O tradutor e editor francês Jacques Bonnet, dono de um acervo de mais de quarenta mil volumes, é uma das maiores autoridades no assunto. Sua coletânea de ensaios Fantasmas na biblioteca (Civilização Brasileira, 160 páginas, R$ 29,90), recém-lançada no Brasil, reúne nove textos sobre seu amor pelos livros. Qualquer comprador compulsivo de literatura deveria fazer o enorme sacrifício de acrescentá-la a sua coleção. Com base nos ensaios de Bonnet, elaborei uma lista com suas sete principais razões para viver entre livros. Elas valem tanto para quem já se dedica à formação da biblioteca perfeita quanto para quem apenas gosta de livros, e estava à procura de uma desculpa para transformar seu apreço em loucura.

1) O prazer da posse
Aprendemos a ler na infância e, se conseguirmos escapar das inúmeras outras tentações que roubam a atenção das crianças, é possível desenvolver desde cedo uma paixão pela literatura. A compulsão por livros, porém, só chega mais tarde. Nossa velocidade de leitura se mantém constante, o tempo dedicado a ela se torna escasso e passamos a comprar mais livros do que somos capazes de ler. É uma decisão questionável, ao menos do ponto de vista econômico. "Livros são caros na compra; não valem nada na revenda; são caríssimos quando queremos encontrá-los e estão esgotados˜, escreve Bonnet. O custo é compensado pelo prazer da sensação de posse. Mesmo o exemplar não lido é, de certa forma, conquistado por seu dono. Ou, como diria Bonnet, "também foram ‘lidos’ de um certo modo, estão classificados em algum lugar do meu espírito como na minha biblioteca.” Apesar de prazeroso, o acúmulo de livros não lidos é uma atividade que requer cuidado. Fantasmas na biblioteca reproduz o aviso de Sêneca: "Que me importam esses inumeráveis livros e essas bibliotecas, cujos proprietários, durante toda a vida, mal leram as etiquetas?” Por mais que a compra compulsiva de livros seja bem-vista, a meta final deve ser sempre a leitura, ainda que num futuro distante.

2) O flerte e a culpa
A falta de espaço ou de dinheiro podem frear a expansão de uma biblioteca pessoal, mas o maior inimigo do acúmulo de livros é a culpa. Quando a pilha de exemplares comprados e não lidos cresce, até o bibliômano mais perdulário começa a se sentir culpado por seus flertes. Felizmente, os ímpetos de racionalidade não costumam resistir a uma visita à livraria, ou mesmo a alguns minutos diante do computador. Faço uma confissão, certo de que meu caso não é o único. Num dia 31 de dezembro, ao perceber que a quantidade de livros não lidos em meu leitor digital e em minha estante seria suficiente para algumas décadas de leitura, prometi não comprar livros durante o ano seguinte. A promessa foi quebrada antes do fim de janeiro, quando o site de uma livraria anunciou uma promoção imperdível – a primeira de muitas naquele ano. Descobri que a resistência a comprar novos livros só aumenta o prazer de ceder à tentação. Os motivos que fazem um leitor se deixar vencer pelo flerte são os mais variados. Bonnet revela que, em sua juventude, comprou um exemplar de Lolita, de Nabokov, só porque gostou da capa, e se rendeu a O lobo da estepe, de Herman Hesse, por causa do título misterioso, mesmo sem conhecer o autor. Embora alguns livros sejam comprados depois de longos namoros, a maioria chega às estantes graças a essas paixões à primeira vista que, após a compra, se transformam em relacionamentos duradouros.

3) O apego inexplicável

Se compramos livros seguindo critérios quase irracionais, cedo ou tarde nos tornamos vítimas de nossos instintos e maculamos nossas coleções, grandes ou pequenas, com obras de baixa qualidade. Isso nos força a escolher entre o prazer de possuir um livro, mesmo ruim, e a vontade racional de passá-lo adiante e abrir espaço para outro volume, mais adequado às nossas expectativas. Nessas batalhas contra a razão, o desejo de preservação do acervo raramente é derrotado. “A escolha do que se deve guardar ou rejeitar requer uma energia que eu sempre economizei”, diz Bonnet. "Quem sabe se, no futuro, não terei necessidade de uma obra que, na hora, achei medíocre?"

4) O bibliotecário em cada um de nós
Os entusiastas do livro digital têm, aqui, um trabalho (e um passatempo) a menos do que os admiradores dos livros de papel. Em leitores digitais como o Kindle ou o Kobo, bastam alguns cliques para organizar toda sua coleção por título, data de leitura ou nome do autor. Os átomos são muito mais indóceis que os bits. Domar uma estante de pequeno ou médio porte exige no mínimo uma tarde de trabalho. Organizar uma coleção de milhares de volumes é uma tarefa para a vida inteira. Além do esforço braçal necessário para remover os livros das prateleiras e reorganizá-los, há o esforço intelectual de escolher entre vários critérios de organização. Ao contrário dos arquivos digitais, os livros de papel aceitam uma infinidade de classificações. Bonnet reproduz uma lista elaborada pelo romancista francês Georges Perec. Segundo ele, é possível organizar os livros por ordem alfabética (de título ou nome do autor), por continentes ou países, por cores, por data de aquisição, por data de publicação, por formatos, por gêneros, por grandes períodos literários, por línguas, por prioridades de leitura, por encadernações e por séries. Em seguida, Bonnet expõe as falhas de cada um desses critérios e volta a citar Perec: "Nenhuma dessas classificações é satisfatória em si mesma. Toda biblioteca se ordena a partir de uma combinação dessas classificações."

5) A força dos hábitos

Os acumuladores de livros podem ser divididos em dois grupos. Alguns tratam seus exemplares com reverência. Outros encaram os livros como meros objetos de estudo e trabalho. Os membros do primeiro grupo tentam manter ao máximo o estado de conservação das obras. Ao abrir um volume da coleção de um deles (com a devida autorização do dono, acompanhada de instruções de manuseio), é difícil notar traços de contato com mãos humanas. Os elementos do segundo grupo são facilmente reconhecidos por suas estantes cheias de exemplares castigados pelo uso e repletos de anotações. Bonnet se enquadra no segundo grupo. "Escrevo em meus livros, a lápis, com caneta hidrográfica ou esferográfica. Aliás, não consigo ler sem alguma coisa à mão." Os conservacionistas podem se gabar do fato de que suas coleções sobreviverão por mais tempo. Os anotadores compulsivos têm o privilégio de reler suas anotações anos depois de feitas, como recados ao leitor futuro numa máquina do tempo.

6) Memórias e fantasias
Embora a presença opressora dos livros comprados e não lidos iniba esse comportamento, é inevitável reler alguns exemplares que insistem em sair da estante para a cabeceira. Ao abrir um livro já lido, revisitamos não apenas as palavras do autor, mas também nosso próprio passado. O estado de espírito que tínhamos na primeira leitura ressurge na leitura seguinte, mesmo depois de muitos anos. Reler é discutir consigo mesmo, e muitas vezes discordar de julgamentos do passado. Bonnet cita o exemplo do escritor modernista Paul Morand, cujo estilo o encantara aos 20 anos, mas tornou-se insuportável numa releitura depois dos 60. Quem acumula enormes pilhas de livros não lidos depara com outro prazer da memória, mais melancólico: o de se emocionar pela primeira vez com um exemplar comprado há muitos anos e imaginar o que teria sido diferente em sua vida se o tivesse lido na primeira oportunidade. Quanto maior a lista de obras a ler, mais numerosas são as vidas paralelas. Se suas leituras não têm qualquer influência sobre suas decisões e seu modo de viver, você está lendo os livros errados.

7) O dom de esquecer
Por maiores que sejam as estantes, ou o espaço nos discos rígidos, a tarefa de processar o conteúdo (ou ao menos as capas e títulos) de uma coleção de livros cabe, em última instância, à mente do leitor – um instrumento fascinante, mas pouquíssimo confiável. Com o passar dos anos e o acúmulo dos livros nas prateleiras e na memória, obras que lemos com atenção podem ser quase totalmente esquecidas. Bonnet cita Pierre Bayard, autor de Como falar dos livros que não lemos, para explicar essa fraqueza. “É, antes de tudo, difícil saber com precisão se lemos ou não um livro, pois a leitura é o lugar do evanescente", diz Bayard. Ao conversar com outro leitor sobre um livro que já lemos, não é raro perceber que deixamos de notar aspectos cruciais da obra, ou que apagamos trechos inteiros da memória. Se escolhermos o texto certo e esperarmos tempo o bastante para que a memória comece a nos trair, cada releitura da mesma obra pode ser uma experiência totalmente nova. Mesmo quem vive entre quarenta mil livros é capaz de perder-se num só.

(Este é o texto de estreia da coluna de Danilo Venticinque no site de ÉPOCA. Ele escreverá às terças-feiras.)

  Danilo Venticinque é editor de livros de Época. Conta com a revolução dos e-books para economizar espaço na estante e colocar as leituras em dia. Escreve às terças-feiras sobre os poucos lançamentos que consegue ler, entre os muitos que compra por impulso (Foto: Sidinei Lopes/Época)

Fonte: Época





Se alguém ainda não tinha motivos para viver entre livros acho que esses sete que o Danilo nos mostrou são uma boa razão. Estou realizando um grande sonho que sempre tive em minha vida, estou fazendo minha biblioteca particular, tenho ciúmes de meus livros e sei muito bem a quem emprestar. Infelizmente muitas pessoas não sabem como tratar um livro, então isso complica o gesto, emprestar e incentivar se torna difícil.
Mas não importa, vivo entre meus livros e vivo mais feliz, incentivo como posso todas as pessoas a fazerem o mesmo, investirem na literatura. Desejo que vocês tenham apreciado a matéria do Danilo tanto quanto eu. Beijos e até a próxima postagem.








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12 comentários:

  1. Gostei bastante de como o Danilo trabalhou em cima de cada tópico. O prazer de comprar um livro novo, mesmo sabendo que não se pode comprar, é algo impagável. E eu adoro reler alguns livros :')

    Beijos
    www.procurei-em-sonhos.com

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  2. Oi,
    Adorei o Post. Eu gosto muito de ler um livro, mas gosto bastante de ter também, por isso não pego muitos livros emprestados, gosto da sensação de ele ser meu, e sempre que quiser olhar ou ler, ele estar.
    Post Perfeito.
    Beijos,
    Yasmin
    deitadosnagrama.blogspot.com.br

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  3. Adorei o post!
    Realmente muito interessante os aspectos abordados por Danilo!
    Beijinhos
    Rizia - Livroterapias

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  4. noticia da hora valeu
    livroazuis.blogspot.com.br

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  5. Bem legal a matéria, e me identifiquei especialmente com essa parte:
    "com a devida autorização do dono, acompanhada de instruções de manuseio)". Sempre que empresto um livro para alguém, especialmente se for a primeira vez que empresto para a pessoa dou milhões de instruções.

    O negócio da culpá é interessante, mas eu não sinto culpa dos livros novos ainda não lidos porque sei que a vez dele tá certa de chegar. Eu sinto mais culpa dos antigos que há muito tempo não releio. De ficarem ali parados sem nem ao menos eu pensar em quando irei pegá-los.

    Té mais...
    http://bmelo42.blogspot.com.br/

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  6. Muito boa essa matéria, e todos os motivos listados! Eu também quero montar minha biblioteca particular, ainda tenho poucos livros e não tenho uma estante, mas sei que eles estão ali, meu refúgio para quando eu precisar!

    Beijos, Raquel.

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  7. Gostei do post !!!
    Achei bem interessante os pontos abordados pelo Danilo.

    *bye*

    http://loucaporromances.blogspot.com.br/

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  8. Que texto muito bem escrito!!
    É incrível como nós, leitores, somos parecidos.
    Sempre estamos com ciúmes dos nossos livros, receio de emprestar, muito cuidado, apego máximo, limpeza e gastos. ahsuahau
    Adorei.
    Beijo

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  9. Excelente matéria!
    Livros são para a vida toda e minha paixão por eles também! Acho, que nunca vou acostumar com livros digitais, mesmo que eu seja aficionado por tecnologia.

    Lucas / Era uma vez...
    livrosecontos.blogspot.com

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  10. Oi Vivi
    Adorei essa matéria! Demais
    Beijinhos
    Renata
    Escuta Essa

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  11. Vivi que matéria magnífica amiga! Estou aqui encantada e emocionada com as palavras do Jacques Bonnet.
    Muitos dos trechos, postei no face, a medida que fui lendo o post, pq cabia tão bem comigo e com meus pensamentos.
    Fiquei muito, mas muito emocionada com esse texto e com toda certeza vou comprar o livro do Jacques, para ler suas ideias de maneira completa...
    Parabéns amiga, pelo post mui belo!
    Bjokas

    www.lerepensar.com

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  12. Ah nossa, como não amar esse texto? Dá vontade de imprimir e entregar a cada um que faz a pergunta :"Por que você tem tantos livros?" Só quem precisa de livros para respirar que entende.
    Obrigada Vivi, por compartilhar a matéria do Danilo, á havia lidos outros textos dele referente a leitura. Esse ainda não tinha lido.
    Beijo,

    Bye da Pah
    Livros Estrelas

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